O Homem que eu deveria ser

Os homens não sabem viver as suas emoções, até porque existem muitos homens que julgam que vão ser menos homens se se permitirem a viver as suas emoções… é a velha expressão “homem não chora…”! Todos nós homens já ouvimos essa expressão a determinada altura da nossa vida! E a realidade é que essa simples frase formou muitas mentalidade e muitos conceitos de masculinidade, aquilo a que eu chamo masculinidade toxica! E o mai surreal de tudo é que eu fiz, a determinada altura isso com os meus filhos… Sei que muitas vezes fui o pai que achei que era o correto e fui contra o que sentia, no entanto não carrego peso nem culpa, já que na realidade eu fiz o melhor que podia e que sabia… além disso não tenho a pretensão de ser perfeito e como tal tenho de aceitar que nem sempre acerto e que garantidamente que quando se fala do papel de Pai, me farto de errar e de acertar, até porque é algo que não aparece na vida com manual de instruções e se aparece-se, nós homens iríamos deitar o manual fora e fazer de conta que sabemos o que estamos a fazer!

No papel de Pai eu faço muitas vezes de contas que sei o que estou a fazer, quando na maioria das vezes não faço a mais pequena ideia se o que estou a fazer é o correto ou não… E não é essa a ideia que temos sobre a paternidade? Que temos de educar os nossos filhos e que temos de fazer com que eles nos respeitem acima de qualquer coisa! Pelo menos comigo foi assim… Eu tinha de respeitar o meu Avô acima de tudo, mesmo que não entendesse o porque disso acontecer! Lembro-me que quando era criança e vivia no campo, era normal os miúdos irem com os pais à caça! E claro que o meu avô queria que eu fizesse o mesmo, claro que eu nunca fiz tal coisa, até porque foi coisa que nunca me fez sentido nenhum… E sabem qual era a sessão com que eu ficava sempre? Que era muito pouco homem… Porque ao domingo quando todos saiam para caçar eu ficava em casa, tal como as mulheres e as crianças pequenas! E atenção que digo isto sem magoa nenhuma, muito pelo contrário, as coisas são como são e os nosso pais e educadores fizeram por nós o melhor que sabiam na altura, tal como eu faço o melhor por cada um dos meus filhos mediante o que sei e no que não sabia à uns tempos!


No entanto por muito que a intenção fosse positiva, a verdade é que eu cresci sempre com a sensação que não era a representação de homem que todos desejavam e precisavam que eu fosse… E foi construindo uma forma de estar e de pensar sobre mim que muitas vezes me serviu mais para me desvalorizar e me desconsiderar e me achar menos homem, isto aos 8, 9 ou 10 anos! E toda a minha formação enquanto criança começou e se manifestou nessa base, já que depois quando prestamos atenção nas diferenças, vamos encontrar mais diferenças e vamos encontrar mais coisas que nos afastem e menos que nos aproximem. E eu fui sempre encontrando cada vez mais coisas que me afastavam do estereótipo de homem que eu deveria representar e o Homem que eu deveria ser! 


E como devem calcular isso para uma criança que vivia num meio pequeno, com poucas representações, sejam masculinas sejam femininas, isso causava duvidas e não me permitia perceber quem eu era e que era o correto, na realidade lembro-me de olhar em volta e não sentir que me identificava com ninguém… e isso foi fazendo com que aos poucos eu me fosse fechando e me fosse virando cada vez mais para dentro, eu não era como os outros, eu chorava e tinha sentimentos à flor da pele, mas não os podia mostrar nem sentir, já que não sabia se isso seria o correto e se isso seria coisa de “homem”, como tal eu ignorava o que sentia. Até porque isso depois trazia o conceito de ser colocada em causa, de forma sempre indireta a minha sexualidade! Como se isso fosse um tema que eu naquela idade entendesse! 


Claro que isso, foi sempre fazendo com que a cada ano que passava me fosse fechando cada vez mais dentro da minha bolha, dentro da minha carapaça e não deixava ninguém entrar, a não ser um pouco a minha avó e a minha madrinha, que me permitia ter a minha vulnerabilidade e era onde eu sentia que podia ser o que fosse que era sempre bem acolhido e recebido! Depois começo naturalmente a ter sempre mais amigas do que amigos, acho que nunca tive um melhor amigo até aos meus 20 anos… Até ai eram melhores amigas e amigas, tinha vários amigos, mas as minha amizades era essencialmente femininas. Claro que isso trouxe sempre outras questões positivas, mas não me trouxe grandes problemas na escola, eu fui sempre lidando bem com as coisas que se foram passando na minha adolescência no que diz respeito ao bullying! Fui sempre “esperto” o suficiente para saber passar entre as pingas da chuva e não ter de lidar com muitas situações difíceis. Até porque eu já me achava estranho! Resumindo eu sei que cresce num ambiente em que a masculinidade ainda era uma coisa com peso e em que ser homem implicava uma serie de predicados e de características que eu não tinha de todo e pior que isso nem sequer fazia por ter porque não me fazia sentido nenhum…


Ainda assim tive de sobreviver e de ir aprendendo a lidar com tudo o que sentia e com tudo o que não sentia e isso fez com que fosse sempre guardado dentro de mim demasiadas coisas que eu nem sequer entendia, nem sequer sabia que existia… E como disse no inicio deste texto, a minha forma de ser pai à uns anos atrás era muito nessa representação do que o homem deve ser e deve representar enquanto pai e enquanto marido! Felizmente que hoje em dia e já me passou e que o que não passou está a passar e ando a arranjar forma que passe sem que ninguém por isso, excepto eu que tenho de resolver o que guardei durante anos! O que eu digo hoje em dia ao meu filho que tem 16 anos e que apanhou mais com essa versão de “pai homem das cavernas” é para ele viver todas as emoções e para sentir tudo o que precisa de sentir e se tiver de chorar que chore (Adolescência hoje em dia é uma coisa complexa :) demais), caso contrário está a só a fazer aquilo que eu fiz e com isso mais tarde irá ter de andar a resolver as coisas tal como eu hoje ando a resolver as minhas! 


Esta foi a frase que me levou a olhar para as minhas emoções de uma forma diferente:

“Aquilo que não se olha e não se presta atenção não desaparece, simplesmente ramifica e cresce como ervas daninhas!” Carl Jung


LUDGERO MAIA

Comentários

Mensagens populares